quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Capítulo 39 - Conhecias…

Passei o resto da tarde a arrumar as minhas coisas nos armários e algumas coisas mantiveram-se nas malas, pois não havia espaço para tudo. A tarde transformou-se em noite, e perante a insistência do Brown, fui até á rua para que ele pudesse correr e brincar á vontade. Tirei-lhe a trela que ele odiava, e sentei-me no banco a atirar-lhe a bola de vez em quando. Quando me preparava para voltar para casa, o telemóvel tocou.

-
Estou? – Atendi, sentando-me novamente.

-Bom dia! – Disse o Jake com o seu característico tom alegre.

-Amor! Já tens saudades minhas é?

-Não, na verdade tenho saudades do Brown. Podes passar-lhe o telefone?

-Não, ele está demasiado ocupado a roer a bola.

-Que pena.

-Parvo.

-Então mas como correu tudo? Portugal ainda está no mesmo sítio?

-Sim, hoje estive a manhã na praia.

-Hmm. Que bom! Eu só fui uma vez à praia quando estive aí, mas gostei muito.
Can you wait a second?! It’s my girlfriend for god’s sake! –Interrompe, dirigindo-se a alguém.

-O que é que foi? – Perguntei, confusa.

-Alice’s here, trying to steal the phone from me.

-Shut up! Let me talk to her! –Ouvi a voz da Alice do outro lado. – Hiiii babe! – Disse entusiasmada quando pegou no telefone.

-Hiii! You know Jake’s gonna kill you, right?

-I don’t care. – Riu-se. – How are you? Oh God I miss you!

-I miss you too honey… You two are at work?

-Yes.

-How is it there?

-Boring, like always. And I still can’t believe that you left me alone with this guy.

-Can you give me the phone, please?! – Diz o Jake, irritado.

-No, she’s mine now! – Respondeu-lhe a Alice, sem lhe passer o telefone. – And how was to come back? How are your parents?

-They were surprised, but very happy.

-Ups! The boss is coming. – Diz apressada.

-Give me that! – Diz o Jake. – Babe, o Arthur vem aí, eu ligo-te mais logo.

-Ok, vão lá antes que ele vos despeça. Beijinho.

-Amo-te. – Disse também apressado e desligando o telefone de seguida.

Levantei-me, e enquanto chamava o Brown para voltarmos para cima, o Rafa passou com o carro, em direcção às traseiras do prédio, onde é o estacionamento. Aguentei-me mais um bocadinho ali, para depois subir com o Ricardo.

-‘Tão maninha? Estás aqui? – Diz o Ricardo quando ambos chegam ao pé de mim.

-Não, estás a ter uma visão. Totó.  – Respondi-lhe, despenteando-o.  

-Brownie! – Chama o Ricardo, ficando entretido a mandar a bola ao Brown.

-Então e… a tarde, foi boa? – Perguntei ao Rafa, já que estávamos a olhar um para o outro silenciosamente.

-Foi. Aqui o surfista da banheira não largou o mar. – Disse, piscando o olho e dirigindo-se ao meu irmão.

-Olha-me este! O surfista do bidé a falar. – Responde o meu irmão.

-Enfim! Vamos para cima surfistas da casa de banho? – Rematei a conversa e fomos para casa.  

Entrar na minha casa  e ver o Rafa a entrar na dele ao mesmo tempo, fez me lembrar todos os momentos em que nos despedíamos ali, com beijos e abraços apaixonados, prestes a encarar os nossos pais e fingir que não se passava nada entre nós.  

-Adeus, até amanhã. – Disse-lhe, fechando a porta de casa.

Fui ajudar a fazer o jantar, e depois do jantar voltei para o meu quarto, onde passei algumas horas a acabar de arrumar as coisas e a procurar emprego nos jornais e na internet.

-Rita. – Diz a minha mãe ao entrar no quarto. – Nós vamos nos deitar. Ainda vais ficar aí muito tempo?

-Não, também já vou daqui a bocado.

-Vá, não fiques aí muito tempo filha. Até amanhã.

-Boa Noite, até amanhã.

 Já me doía a cabeça de estar no computador, e não tinha sono para me ir deitar, por isso coloquei os fones e, de roupa interior, comecei a dançar lentamente R&B. Estava eu de olhos fechados, completamente concentrada na música, e quando abri os olhos, estava o Rafa sentado no parapeito da janela, a observar-me.

-Rafael…! – Tirei os fones rapidamente e comecei a vestir-me.

-Porque é que paraste? – Ri-se. – Estavas tão bem.

-Estou a ver que não perdeste os hábitos de fantasma. – Disse-lhe, continuando a vestir-me.

-Rita... É mesmo preciso estares a vestir-te? Eu conheço o teu corpo melhor que o meu.

-Conhecias… Já não somos nenhuns miúdos Rafael.

-Pois, realmente mudaste em algumas coisas. – Diz, fixando-se no meu peito, e fazendo um sorriso maroto.

-Hã..? PARVO! – Mandei-lhe com uma almofada.

-Olha aí oh, acordas os tios… - Mandou a almofada para cima da cama.

-Tu é que não devias estar aqui. A tua noiva? Não está à tua espera?

-Está. Eu deixei-a na cama, para vir aqui ver-te dançar.

-Então vai ter com ela, que te deves divertir mais do que estar aqui.

-Tu sabes bem que eu estou sozinho, estás com coisas para quê?

-Eu não estou ‘’com coisas’’ Rafael.

-Estás sim. Estás agressiva, e nem me consegues olhar nos olhos.

-Eu estou cansada e vou dormir, tu devias fazer o mesmo. – Comecei a tirar as coisas de cima da cama.

-Estás a ver? Nem consegues falar comigo como deve ser.

-Tu achavas o quê? Que depois de tudo o que se passou tudo seria igual? Que eu conseguia falar contigo da mesma maneira, e fingir que não se passaram 6 anos? Nós não somos as mesmas pessoas, Rafael.

-
Porque é que não páras de chamar-me Rafael?

-
Porque é o teu nome.

-Tu sempre me chamaste Rafa. Eu sou o mesmo, Rita.

-Tu estás noivo. Tens a tua vida, eu tenho a minha.

-Eu não te estou a perceber. Tu esperavas o quê?! Que eu ficasse à tua espera? Como tu ficaste à minha? Eu voltei para ti! E onde é que tu estavas?! Em Nova Iorque!

-Voltaste para mim?! Depois de ires embora sem te despedir, de passares um ano sem dizer nada? Eu perdi a conta das vezes que eu tentei falar contigo. As únicas noticias que eu tinha eram os meus pais que davam, e eles evitavam tocar no assunto.

- Não percebes que se eu não me despedi de ti foi porque não fui capaz de te ver mal? Eu preferi ir de uma vez, e evitar mais sofrimento.

-Linda maneira que arranjaste de não me fazer sofrer! Eu passei meses a tentar falar contigo.

-Eu preferi esperar que pudéssemos estar juntos. Falar contigo sem poder estar contigo, só ia causar mais saudades. E eu tinha que apoiar o meu pai! Quando o meu pai estivesse bem, aí sim, eu podia pensar em nós! E foi o que eu fiz! Eu voltei logo a seguir ao enterro do meu pai! Só pensava em estar contigo.

-Não vamos falar disto Rafael. Faz parte do passado, não nos adianta de nada. O que interessa é que tu estás bem, e eu estou bem, e somos felizes. Acabou.

-Não, não acabou. Porque tu estás a agir como se a culpa de não termos ficado juntos fosse minha, e não foi.

-Então foi minha, é isso que estás a dizer?

-Sim, é isso que estou a dizer.

-Tudo bem, ganhaste. A culpa foi toda minha. Estás contente?!

-Não.

-Eu espero que sejas muito feliz com a tua noiva.

-Vou ser.

-Ainda Bem. Podes ir agora? Eu gostava de me deitar.

-Eu vou. Só não esperes que eu deseje que sejas muito feliz com o teu namorado.

-Não precisas. Eu já sou.

Ele saiu de seguida, e eu deixei-me cair na cama. Sem saber bem o que estava a sentir, comecei a chorar bastante, sem me conseguir controlar. Estava chateada comigo, por estar assim, mesmo depois deste tempo todo ele ainda me afectava daquela maneira. E isso não podia acontecer. Olhei para o enorme peluche que veio comigo de Nova Iorque, que simbolizava o Jake, e senti-me pior ainda. Sentia que o estava a trair. Mesmo que não tivesse acontecido nada entre nós, na minha cabeça só existia o Rafael.

domingo, 2 de outubro de 2011

Capítulo 38 - Eu levo-te.

-Eu… - Respondi com um sorriso um pouco forçado.

-Esperem… Vocês conhecem-se? – Perguntou o Rafa confuso.

-Digamos que tivemos um pequeno encontro hoje de manhã. Fico contente que tenhas deixado a tua bola de pêlo em casa. – Disse-me num tom de provocação.

-Sim. – Respondi, tentando controlar-me para não lhe dar a resposta que merecia.

-Bom, seja como for, tenho fome. – Diz o Rafa meio confuso. - Vou ali servir-nos qualquer coisa.

-Rafa, o Ricardo não veio contigo? – Perguntei-lhe.

-Ah sim, ele foi só á casa de banho já vem aí. – Afastou-se da mesa e dirigiu-se à cozinha.

-Então Mara, estás boa? – Perguntou-lhe a Tixa, com a sua simpatia natural.

-Sim. E vocês?

-Estamos todos bem. Senta-te. – Disse-lhe o Rui.

-Então… E…Rita, eu nunca ouvi falar de ti. – Disse-me após sentar-se na nossa mesa.

-Pois, eu estive fora vários anos.

-Ah… E agora, moras ali perto da casa do Rafael?

-Pode-se dizer que sim. – Respondi-lhe, e ouviu-se uma iniciativa de riso da parte da Di.

-Ora aqui está a paparoca. – Chegou o Rafa com a comida deles. – O que é que eu perdi? 

-Nada de especial. – Disse a Di. – É verdade, o campeonato de surf é amanhã, não é? Eu vi um panfleto á entrada do bar.

-É. E é na Ericeira, mesmo ao pé da nossa casa. - Disse o Rui.

-Vais participar Rafa? – Perguntou a Di.

-Claro, sabem como é. Vou ganhar aquilo tudo.

-Tshii, o teu padrinho é tão convencido filha. – Diz o Rui.

-O que é ‘’convenchido’’? – Pergunta a Maddie.

-É alguém que sabe que vai ganhar. – Diz-lhe o Rafa. – O teu pai está é cheio de inveja porque já não cabe no fato de surf.

Todos se riem, menos o Rui, que não tinha achado graça nenhuma.

-Eu não estou gordo! Estou?! Amor? – Pergunta indignado.

-Claro que não meu marido lindo. – Dá-lhe um beijo. – Isto é só inveja. – Pisca-nos o olho e todos se voltam a rir.

Entretanto o meu irmão chegou, acabámos todos de almoçar, ficámos no bar a conversar mais um bocado, e depois seguimos para a praia. Estávamos todos deitados nas respectivas toalhas: A Madalena a dormir debaixo do chapéu, juntamente com o pai, a Tixa a ler, a Di a observar os rapazes que passavam, o Ricardo a observar também, mas as raparigas, e o Rafa deitado com a namorada a fazer-lhe massagens nas costas. Eu? Eu mantinha-me ali a pensar que tudo aquilo era um sonho e que mais tarde ou mais cedo iria acordar com os gritos da Marisa a avisar-me que estava atrasada para ir para o café.

-
Rita! – Alguém chamou mas eu nem ouvi. – RITA!

-Sim? – Respondi, voltando ao planeta Terra.

-O teu telemóvel está a tocar! Estás sempre na lua. – Disse o meu irmão.

Levantei-me e caminhei até á minha mala de onde eu tirei o telemóvel barulhento. Olhei para o ecrã e vi que era a Marisa.

-Estou? – Atendi.

-Hii! Como estão?

-Estamos todos bem. E a menina? Já viste os teus pais?

-Já, eles voltaram de manhã, tenho estado o dia todo a matar saudades.

-Fazes bem. Eles estão bem?

-Sim, não me largam nem um bocadinho. – Ri-se. – E essa praia? Está-se bem aí?

-Sim, já tinha saudades.

-Também eu tenho. E quem é que está aí?

-O Nando não está. – Digo com um tom provocador.

-Oh, não comeces! Só perguntei por perguntar. Olha, não me chegaste a contar, como reagiram os teus pais quando te viram?

-Bem, tal como os teus também não me largaram.

-O Brownie? Não estranhou a casa e as pessoas novas?

-Estranhou, nem queria entrar. Aliás, eu até não quero demorar muito porque ele agora não me larga, tem medo que eu me vá embora e o deixe cá. Tive que sair ás escondidas de casa.

-Oh, é normal, foi uma mudança muito grande.

-Pois foi. E eu tenho que começar a procurar emprego, e a ver as casas que não tarda o Jake vem.

-Sim, eu também vou começar a procurar castings ou assim, não quero perder nenhuma oportunidade. E por falar em rapazes… Tu já reencontraste o Rafael?

-Sim. – Disse sem me alongar muito.

-Sim..?! E então?

-E então nada…

-Só isso?! Ahh… Ele está aí com vocês?

-Yap.

-Já percebi. Depois contas-me. Vá, continua a curtir a praia e manda um beijnho meu ao pessoal.

-Eu mando, beijinhos. Love you.

-Love you too.

-A Marisca mandou-vos um beijinho. – Disse-lhes após desligar o telemóvel.

-Mas porque é que ela não veio afinal? – Perguntou a Tixa.

- Porque os pais voltavam de viagem hoje de manhã e ela ficou à espera deles. –Explicou a Di.

-Pessoal, eu se calhar vou andando. Ainda tenho as malas todas para arrumar e montes de coisas para fazer. – Disse à medida que arrumava o telemóvel na mala.

-Aish, oh mana! – Disse o Ricardo. – Ainda nem sequer tive tempo para surfar.

-Fica para outro dia, pode ser?

-Mas já?! – Perguntou a Di. – Ainda é tão cedo!

-Sim, mas já deu para estar com vocês, e eu tenho mesmo muita coisa para tratar.

-E vais como? – Perguntou a Tixa. – Eu acordo o Rui, ele leva-vos.

-Nem penses! Vamos de transportes. Eu sou bem grandinha.

-Eu levo-te. – Disse o Rafa levantando-se da toalha, deixando a noiva um pouco incomodada, e causando olhares entre as minhas amigas. – E deixas o puto ficar mais um bocadinho que eu levo-o comigo depois.

-Ya, eu vou com ele. Vá lá maninha. – Pediu o Ricardo trocando olhares com o primo.

-Está bem peste. Mas eu tenho de ir. Eu apanho o comboio, chego num instante.

-Rita. – Insistiu o Rafa. – Eu levo-te.

-Levas? – Intrometeu-se a Mara. – E voltas?

-Sim, ainda tenho que vir ao bar à noite.

-Rafa, a sério, não precisas de ir, eu…

-Vamos? – Interrompeu-me já com a minha toalha na mão.

-Está bem. – Deixei de resistir e despedi-me de todos.

Subimos as escadas de madeira em silêncio, até chegarmos ao parque de estacionamento. Segui-o e este foi ao encontro de um moderno automóvel.

-A tua mota? – Perguntei.

-Está em casa. – Respondeu. – O carro dá me mais jeito para tranportar cenas para o bar, e a Mara não anda de mota.

-Ah… Percebo.

Ele abriu o carro e ambos entrámos. No caminho tocou o CD do Bob Marley, artista que ele sempre gostou e cujo me trouxe recordações que eu não fazia questão de ter. Sem ser a musica, estava um silencio absoluto e os nossos olhares não se cruzaram durante toda a viagem.

-Chegámos. – Disse, parando o carro em frente ao nosso prédio.

-Obrigada por me teres trazido. - Disse, finalmente olhado para ele.

-Não foi nada.

-Adeus. – Aproximei-me e dei-lhe um beijo no rosto.

-Adeus. – Disse, olhando-me nos olhos intensamente. Olhar este que me deixou balançada e me fez sair do carro antes que fizesse alguma asneira. Ia já a caminhar para a porta do prédio quando me virei para trás.

-
Rafa? – Chamei, aproximando-me da janela aberta do carro.

-
Sim?

-Não o tragas muito tarde, ele pensa que já é grande mas ainda é uma criança.

-Nós com a idade dele já fazíamos muita coisa. – Sorri. – Mas está descansada, eu trago-o cedo.

-Obrigada. – Lancei um último sorriso e entrei no prédio.

Cheguei a casa e mesmo antes de abrir a porta de casa já ouvia o ladrar do Brown do outro lado. Assim que abri a porta correu na minha direcção abanando a cauda e dando pequenos pulos.

-Então maluquinho? Eu não me fui embora tonto.

- Rita, és tu? – Gritou a minha mãe da cozinha.

-Sim mãe!

-O teu irmão? Não veio?

-Ele quis ficar mais um bocadinho. Vem com o Rafael mais daqui a bocado.

-Já viste o teu primo?

-Já.  – Respondi. 

-Ele conheceu-te?

-Claro mãe. Nós crescemos juntos, e eu não mudei assim tanto.

-E conheceste a noiva dele? Já veio cá a casa várias vezes.

-Sim, conheci. O pai? – Perguntei, tentando mudar de assunto.

-Está no café a ver a bola com os amigos.

-Faz ele bem. Eu vou para o meu quarto arrumar algumas coisas.

-Queres que te ajude?

-Não é preciso mãe, eu safo-me.

-Está bem, se precisares de alguma coisa diz.

Dei um brinquedo ao Brown e fui para o quarto.

Capítulo 37 – Tu…?!

Pronunciar aquele nome estando á sua frente fez com que as imagens do nosso passado corressem pela minha cabeça e pelo meu coração. A verdade é que ele estava ali, aquele que em tempos tinha sido tudo para mim. O meu corpo não se moveu, enquanto ele se colocou á minha frente. Apenas o meu olhar conseguia manifestar-se. Enquanto eu tremia por todos os lados, ele mantinha-se com um ar descontraído, característico da sua personalidade. Observei cada traço do seu corpo, a tentar descobrir o meu Rafael naquele homem, sim, porque agora não era apenas um rapaz, mas sim um homem. Estava ainda mais alto, tinha o cabelo rapado, uma ligeira barba, a pele morena, e cerca de 5 tatuagens distribuídas pelo seu corpo bem cuidado. À medida que o observava um turbilhão de sentimentos tomava conta de mim. Começou por ser uma enorme saudade, vontade de o agarrar, beijá-lo, e não pensar em mais nada. Depois passou a ser um ódio tremendo por este se ter ido embora sem sequer se despedir, por todas as noites que chorei ao sentir a sua falta, por todas as mensagens, emails, cartas, que mandei sem obter resposta, e por, ainda me afectar desta maneira depois de todo este tempo. No entanto, apesar desta mistura de sentimentos, nenhum deles prevaleceu e o silêncio manteve-se enquanto os nossos olhares se cruzavam.

-Quando é que estavas a pensar dizer-me que voltaste?

-Ainda não tive oportunidade, só isso. – Tentava parecer normal, quando na verdade estava a tremer de nervosismo.

-Voltaste quando? – Sentou-se num dos bancos do balneário.

-Ontem.

-Estás em casa dos teus pais?

-Sim, pelo menos por enquanto. E tu?

-Também. Mas estou sozinho, a minha mãe não quis voltar, ficou no Norte com o meu irmão e o meu sobrinho.

-Deve estar enorme. Como é que se chama?

-Paulo. – Fez-se um momento de silêncio. Era o nome do meu tio, o pai do Rafa.

-O teu pai ia ficar muito contente. Ele chegou a conhecer o neto?

-Sim, ainda passou uns meses com ele. – Aquele assunto causava um ambiente pesado e um silêncio absoluto no balneário. O brilho natural dos seus olhos havia desaparecido e eu tentei mudar de assunto.

-Então e tu…? Tens uma escola de surf, um bar e… Estás noivo. Parabéns. – Disse-lhe sentando-me no banco á sua frente.

-E como é que sabes isso tudo? – Disse com um sorriso irónico.

-Nós temos os mesmos amigos, é normal eu já saber.

-Pois, eu sei. Então e tu? O teu namorado, quando é que vem?

-Como é que…?

-Nós temos a mesma família, é normal eu já saber. – Ambos soltámos um riso leve.

-Ele vem daqui a uns meses.

Ouvi passos e entrou um rapaz pequeno, provavelmente com os seus 8, 9 anos, que se dirigiu ao Rafa.

-Rafa, já acabámos o aquecimento. Vens?

-Espera um bocado piolho, eu vou já.

-Posso experimentar a tua prancha? – Pergunta o rapaz, entusiasmado.

-Com cuidado, ainda a magoas.

-Fixe!! – Saiu a correr, e voltámos a ficar a sós.

-Sempre tiveste imenso jeito para crianças. – Disse-lhe.

-Nã, isso pensas tu. Eu como crianças ao pequeno almoço.

-Sim, claro. – Ambos soltámos um sorriso.

-Bom… - Levantou-se. – Eu tenho de ir. Tu vais ficar por aqui?

-Sim, eu estou com o pessoal lá ao fundo.

-Então ainda nos vemos por aí…Até já. 

Aproximou-se de mim e a respiração de ambos acelerou. Sem saber o que fazer, e meio atrapalhado deu-me um leve beijo na cara e saiu. Já estava fora do balneário e…

-Rafael! – Gritei.

-Sim? – Espreitou pela porta.

-A toalha…

-Ah, sim… Podes por nesta porta aqui da frente que diz ‘’privado’’? É que eu estou meio atrasado par…

-Para a aula. – Interrompi. – Vai lá, não te preocupes.

Sorriu e voltou a desaparecer. Saí do balneário e fui pôr a toalha na sala de arrumos onde havia entrado inicialmente. Quando saí dei uma olhadela para a aula de surf que estava a decorrer não muito longe dali, onde já estava o Rafa, a sorrir e a meter-se com os miúdos. Fiquei como que maravilhada com aquela imagem, apenas desviei o olhar quando ele percebeu que eu o fixava. Nesse momento virei-me rapidamente e caminhei pela areia na direcção da Di e dos outros. Estavam todos deitados nas respectivas toalhas, menos a Madalena, que estava a fazer bolinhos de areia com a ajuda do balde e da pá.

-Demoraste tanto tempo! O que é que se passou? – Perguntou a Di elevando a cabeça e apoiando-se nos cotovelos.

-O Rafa… Ele foi ter comigo ao balneário, nós estivemos um bocadinho a conversar.

-O…? A sério?! Como é que ele soube que estavas aqui? – Continuou a Di, curiosa.

-Oh, deve ter sido o meu querido irmão.

-Então e como é que correu? – Perguntou a Tixa.

-Correu bem. Nós também não tivemos muito tempo a falar, ele tinha que ir dar a aula.

-Pois… Mas já viste? Ele foi atrás de ti assim que soube que estavas cá. – Começou a Di.

-Sim, e daí? Eu sou prima dele, é normal. Não comeces Diana Maria!

-Já não está aqui quem falou. Mas temos muito que conversar minha menina.

-Está bem sua melga.

-Mamã, tenho fome! – Disse a Madalena aproximando-se da Tixa.

-Tens filha? Então, olha aí tantos bolinhos. – Disse o Rui apontando para os bolinhos de areia que ela tinha estado a fazer.

-Oh! – Gritou. – Aquilo não dá papá!

-Pois, eu também comia qualquer coisinha, e apesar daqueles bolos terem muito bom aspecto, acho que não vou experimentar. – Disse a Di.

-Já está quase na hora de almoço, vamos ali ao bar.

-Vamos ao bar do ‘’padinho’’?

-Sim. – Respondeu a Tixa à medida que se levantava e começava a arrumar as coisas.

-Boa!! – Disse a Maddie com um salto.

Arrumámos tudo nos sacos e fomos até ao bar da praia. Quando entrámos, escolhemos uma mesa e sentámo-nos. Fizemos o nosso pedido, e estávamos já a meio do almoço quando entra o Rafa no bar. Depois de ir ao balcão e à cozinha, dirige-se á nossa mesa.

-Então pessoal, está tudo bom?

-Bom?! Vinha uma barata no meu prato. – Diz o Rui.

-Oh, vai á merda tu! – Responde o Rafa a rir-se.

-Ah! – Vira-se a Madalena bastante indignada. – Disseste uma asneira ‘’padinho’’.

-Ele é assim, temos que lhe por pimenta na língua, não é? – Diz a Tixa à filha.

-Tens razão princesa, o padrinho vai já por pimenta na língua. 

-Não vens almoçar connosco oh? – Pergunta-lhe a Diana.

-Já venho, estou só à espera da Mara, combinei almoçar com ela. – Olha para a porta do bar. – Olhem, por falar nela… Mara! Aqui. – Chamou, levantando o braço à rapariga que tinha acabado de entrar. 

Levantei a cabeça pela primeira vez desde que ela entrou, e fiquei de boca aberta ao ver que…

-Oh meu Deus… - Disse, baixinho.

-O que é que foi? – Perguntou-me a Di que estava ao meu lado.

-A noiva do Rafa, é a miss arrogância.

-Hãn?! – Perguntou, confusa.

-É a rapariga que eu esbarrei hoje de manhã…Oh, esquece, eu depois explico.

-Estava mesmo agora a falar de ti. – Disse-lhe o Rafa quando ela se aproximou.

-Hmm… Estavas? Bem ou mal? – Perguntou, depois de lhe pregar um grande beijo na boca, momento este que eu preferi ficar com os olhos no meu prato.

- Mal, claro. Antes de nos sentarmos deixa-me apresentar-te a minha… - Olhou para mim. – A… A minha… Prima. Rita, é a Mara, Mara, é a Rita.

-Tu…?! – Disse quando finalmente olhou para mim.

Capítulo 36 – Completamente à vontade!

‘’É o Rafa’’ Estas palavras repetiam-se na minha cabeça sem que eu conseguisse controlar. O meu coração apertado batia a mil à hora e parei imediatamente de olhar naquela direcção. Comecei a andar apressadamente atrás delas e concentrei-me no meu caminho.

-Vocês podiam ter-me dito que vínhamos ter com ele!!! Para quê tanto mistério? Eu já vos disse que ele é apenas meu primo, estou completamente à vontade.

-Mas nós não viemos ter com ele. – Explicou a Tixa.

-Nós só viemos para a praia onde por acaso ele tem uma escola de surf e um bar, completamente despropositado. – Continuou a Di.

-Ah… Por acaso… Pois! Mas podiam ter me dito na mesma! E tu maninho, também sabias, não é?

-Sim, eu costumo vir com ele de vez em quando. – Respondeu o meu irmão, mais preocupado em olhar para as raparigas que passavam do que em falar comigo.

-Pois… Claro! – Respondi-lhe atirando-lhe a toalha. 

-Aqui acho que está bom, ficamos aqui? – Pergunta a Tixa ao pousar o saco e o chapéu.

-Sim. Dá cá o chapéu que eu monto.

-Mamã, o meu ‘’bade’’? – Perguntou a Madalena ansiosa por brincar.

-Nãnã minha menina, primeiro o protector! Anda cá. – Respondeu a Tixa tirando o protector solar do saco. – E vocês os três também metem, o sol está perigoso.

-Sim mamã! – Respondemos eu e a Di, imitando duas crianças.

-Vão gozando! Quero ver quando for a vossa vez.

-Tshii! Eu estou bem longe disso, é que falta-me a parte principal: um namorado. –Respondeu a Di.

-Não seja por isso. – Mete-se o meu irmão à medida que lhe pisca um olho.

-Ricardo…! Tu tens 13 anos… Não tens uma fralda para mudar?

-Se for a tua. – Respondeu-lhe do mesmo modo atrevido e levou com o chinelo da Di na cabeça.

Perante esta situação eu e a Tixa já nos ríamos á gargalhada, e a Madalena também, apesar de não perceber a razão da risada.

-Isso não vai durar muito tempo. Acabaste de te formar em psicologia desportiva. Eu nem quero imaginar os atletas lindos que tu vais ter para tratar!! – Incentivou a Tixa enquanto espalhava o protector pela pele branquinha da Madalena.

-Pois, mas para isso preciso de arranjar emprego primeiro. – Lamentou-se a Di enquanto tirava o vestido ficando em biquíni.

-Pois, somos duas. – Concordei.

-Meninas, tenham calma, hão-de arranjar depressa, vão ver. Então e tu Rita, já pensaste nisso?

-Sim, vou começar já hoje à procura. Como o meu curso é mais abrangente, posso tentar em diferentes áreas que envolvam fotografia ou artes visuais.

-Eu não estava a falar disso, tonta! Estava a falar em ter filhos, já pensaste nisso?

-Ahh! Não… Ainda não. De qualquer maneira, quero orientar a minha vida primeiro, arranjar um emprego estável, uma casa... – Fiquei também em biquíni e estendi-me na toalha.

-Sim fazes bem. – Deitou-se também na sua toalha. – Filha, tens fome? – Perguntou dirigindo-se à Madalena que se encontrava em cima do meu irmão, balançando como se este fosse um cavalo.

-Não mamã. IHHAAA Anda cavalinho. – O Ricardo mantinha-se deitado de barriga para baixo, com a cabeça apoiada nos seus braços enquanto ela balançava nas suas costas.

-
Maddie, sabias que os cavalos adoram comer meninas de 3 anos? – Disse-lhe o meu irmão sem se mexer.

-Não é não. Os cavalinhos comem ‘’eva’’. – Continuou a balançar-se enquanto nos ríamos da situação.

Estávamos todos deitados nas respectivas toalhas, com os olhos fechados, fazia-se silêncio, pois a Madalena estava agora deitada nas costas do meu irmão, a brincar com o seu cabelo, e sem fazer barulho.  Ou pelo menos tinha estado, até alguém se aproximar.

-Vejam quem está aqui. – Disse o Rui quando chegou.

-RAFAA! – Gritou a Madalena pisando as costas do Ricardo e saltando para o colo do Rafa.
Toda a gente abriu os olhos e levantou a cabeça, menos eu, que por alguma razão, fiquei muito nervosa e mantive-me com a cabeça enterrada na toalha.

-
Que pirralha tão feia! Eu conheço-te? – Ouvir a sua voz ali tão perto fez me novamente ficar arrepiada, e sem coragem para me levantar e mostrar que havia voltado.

-
Sim! – A Madalena mantinha-se ao seu colo, divertida.

-Deixa ver… És a Mariana? – A pequenina acenou que não. – Ahh! Já sei! És a chatinha da minha afilhada, não é?

-Siim! – Respondeu.

-Pois, bem me parecia. O meu beijinho? – Ela deu-lhe um leve beijo na cara e ele de seguida deu-lhe um forte beijo no seu pescoço pequenino.

-‘Tão senhor professor? Abanca aí. – Disse-lhe a Di. – Há sumos nessa geleira.

-Eu vim só dizer-vos um olá, que eu ainda tenho uma au… - Parou de falar quando viu o Ricardo. – Primo?! Andas aqui a fazer?

-Vim fazer compras… Não se nota? – Responde-lhe sorridente.

- É assim mesmo, puto. – Ri-se. - Á que aproveitar os saldos. Queres vir assistir á aula? Pode ser que aprendas alguma coisa aqui com o priminho.

-Olha-me este. Eu já aprendi tudo o que tinha a aprender contigo. – Levanta-se da toalha e dirigi-se ao Rafa, mas não sem antes me dar uma forte pisadela.

-A tua aula acaba a que horas? – Perguntou-lhe a Tixa.

-Daqui a uma hora.

-Então quando acabar vem ter connosco, para irmos almoçar.

-Sim. – Dá um beijinho à Madalena ainda no seu colo, e pousa-a no chão. – Até já pessoal. – Coloca o braço por cima do Ricardo e este depressa o tira e o empurra. No meio de rasteiras e empurrões, ambos caminham para a escola de surf.

Quando me apercebi que ambos já iam longe, abri os olhos e levantei a cabeça. Tinha os olhares de todos fixados em mim, como que esperando uma explicação.

-O que é que foi? – Perguntei.

-Ainda perguntas?! – Iniciou a Tixa.

-Rita…!! Com que então, ‘’ele é apenas meu primo, estou completamente à vontade’’, não é?

-
Eu sei...! Eu sei… Eu só não quis interromper a conversa. E ele também estava com pressa. O meu irmão? Aquele traidor deu-me uma enorme pisadela!

-
Foi bem feita! Tu devias ter-te levantado e mostrado que estás aqui! Eu não lhe disse nada, mas vocês vão se encontrar mais cedo ou mais tarde. – Continuou o Rui sentando-se na toalha do Ricardo.

-Eu não sei o que me deu malta. Eu falo com ele quando ele voltar. Mas agora preciso de ir á casa de banho. Onde é?

-Os balneários são lá ao fundo, ao lado do bar. Queres que vá contigo? – Ofereceu-se a Tixa.

-Não, não é preciso. Até já.  

Caminhei pela areia, até alcançar um soalho de madeira, que me levaria até aos balneários. Cheguei aos mesmos que se encontravam vazios e entrei na primeira porta que apareceu. Ao ver pranchas de surf, toalhas, colchões, bóias, almofadas, apercebi-me que aquela não era uma casa de banho mas sim uma sala de arrumação, provavelmente do bar que era mesmo ao lado. Quando saí é que vi que na porta havia um aviso a dizer ‘’Privado’’. Ri-me de mim mesma e virei a esquina que cruzava com os balneários. Depois de ir á casa de banho, sentei-me um pouco no banco que havia entre os chuveiros e as casas de banho, para estar sozinha. Só conseguia pensar nele…E continuava a perguntar-me: ‘’Porquê?’’. Sem ter vontade de sair dali, e para refrescar as ideias, decidi ir tomar um bom duche de água fria para ver se deixava de pensar em quem não devia. Depois de longos minutos debaixo do chuveiro, saí da cabine à medida que passava as mãos no cabelo para retirar o excesso de água. Assim que saí um braço com uma tatuagem do Bob Marley atravessou-se á minha frente, dando-me uma toalha, o que me fez apanhar um grande susto pois não estava à espera que estivesse ali alguém. Recebi a toalha sem olhar para o indivíduo a quem pertencia aquele braço moreno e tatuado. No fundo tentava ganhar coragem para ver quem eu tinha a certeza que era quem eu não queria ver. Porém, aquele perfume não deixava margem para dúvidas. Fechei os olhos, respirei fundo, e finalmente virei a cara, encarando alguém que me provocava sentimentos que eu havia lutado estes anos todos para esquecer.


-Rafael...

Capítulo 35 – É o Rafa.

08/07/2017, Sábado.


Acordei e ouvi um barulho vindo da cozinha. Calculei que fosse a minha mãe, pois sempre foi a primeira a levantar-se da cama. Levantei-me e abri a porta do quarto. O Brown levantou-se muito depressa, e com a cauda a abanar e a língua de fora, manteve-se a olhar para mim como se esperasse algo.

-Já sei que queres ir á rua, tens que esperar só um bocadinho. – Fiz-lhe uma festa e saí do quarto. Quando cheguei á cozinha estava a minha mãe de costas, a fazer torradas para o pequeno-almoço.

-Mãe! – Disse ao aproximar-me.

-RITA?! – Surpreendida e meio confusa, largou o que estava a fazer e abraçou-me com força. – Filha, como é que tu…?! Quando é que chegaste?

-Cheguei ontem à noite, não quis acordar-vos. E eu não disse que ia voltar ontem para vocês não ficarem o dia todo preocupados à espera que eu chegasse.

-Tu devias ter-nos dito! Nós esperávamos por ti no aeroporto! Eu ainda nem acredito que estás aqui filha. – Abraçou-me novamente já com lágrimas nos olhos. – Estás mais magra, comeste em condições?

-Mãe! Não comeces, eu estou bem assim.

-Estás tão linda minha querida. A minha menina está tão crescida. – Passa a sua mão pelo meu rosto.

-Tu também mãe, estás linda.

-Anda. – Agarra-me pela mão e puxa-me á medida que caminha para os quartos. - Luís!! Ricardo! Acordem!!

-Aish oh mãe! Olha aí os gritos! – Refila o meu irmão.

-Ele tem razão mãe, deixa-o dormir então. – Disse eu, e ao ouvir a minha voz levantou-se imediatamente.

-Rita?!!  - Abraçou-me. – O que é que..?!

-Vejo que continuas o mesmo preguiçoso para te levantar!

-Teresa, o que é que se passa? Pareceu ouvir a voz da… - Parou de falar quando me viu. – Filha!! Voltaste! – Abraçou-me e rapidamente me vieram as lágrimas aos olhos. – Porque é que não nos avisaste que vinhas? Estás tão crescida!

-Venham, vamos tomar o pequeno-almoço. – No momento em que a minha mãe proferiu a palavra ‘’Pequeno-almoço’’ o Brown apareceu por trás dela o que fez com que esta pulasse com o susto. – Ai!! – O grito da minha mãe assustou-o também e ele colocou-se atrás das minhas pernas.

-Calma mãe, é o Brown, o meu cão. Eu mostrei-vos fotografias, lembram-se?

-Mostraste, mas eu ia jurar que ele era pequeno!!!

-Ele cresceu, era bebé quando vos mandei as fotos.

-Ele é enorme!! Porta-se bem?

-Sim mãe, não te preocupes. E também é só durante uns tempos, até arranjar uma casa.

-Vá, vamos comer que este cheirinho está-me a dar fome! Fizeste panquecas mãe? –Diz o meu irmão ao empurrar-nos a todos para a cozinha.

-Sim seu morto de fome! Filha, que história é essa de arranjar uma casa? Não vais ficar connosco?

-Só até arranjar um emprego e uma casa mãe, tenho que tratar da minha vida, e vou começar á procura já hoje.

-Então e o Jack? Ele também veio? – Perguntou o meu pai antes de dar a primeira dentada numa das panquecas maravilhosas da minha mãe.

-É Jake. – Corrigi. – Ele vem ter comigo quando acabar o curso, eu vim mais cedo para me ir procurando emprego, e uma casa.

-Eu pensava que ias ficar connosco filha. – Lamentou-se a minha mãe.

-Eu cresci minha mãe galinha, não posso ficar aqui em casa para sempre, ainda que seja a opção mais fácil. Eu tenho que ir com o Brownie á rua. – Levantei-me e peguei numa panqueca que coloquei na boca.

-Já? Mas temos tanta coisa para falar.

-Eu não me demoro mãezinha, até já.

Fui tirar a trela da mala que estava no quarto, e coloquei-a no brown, que mostrou alguma resistência pois nunca gostou de a usar. Porém como ele não conhecia bem a zona, preferia assim. Estávamos a sair do prédio e o meu telemóvel tocou. Enquanto o procurava na minha mala cheia de tralha, o Brown aproveitou-se do meu momento de distracção para se soltar e correr pela relva que havia em frente ao prédio.

-HEY! Muito espertinho! Brown, vem cá! – Ele estava com imensa vontade de brincar, e não me deu ouvidos.

No meio de toda esta situação, uma rapariga loira, com um mini cão ao colo dirigia-se a nós. Reparei que o Brown estava fixado no cão, com um ar brincalhão e maroto. ‘’Brown….Não faças isso, por favor!’’ – pensei. De repente, ele corre a toda a velocidade para a rapariga e com um grande salto derruba-a para a relva.

-BROWN!!! – Gritei correndo na direcção deles. – Oh meu deus! Peço imensa desculpa, ele não costuma ser assim. – Estiquei a mão para a ajudar mas ela levantou-se sem requisitar a minha ajuda.

-As desculpas evitam-se! Vê se controlas o idiota do teu cão!! – Disse com um tom arrogante.

-Hey, eu já pedi desculpa!

-Lá porque pediste desculpa não quer dizer que eu aceite! Agora afasta esse saco de pulgas de mim e do meu terry.

-Ui… Ok Paris Hilton! Vê lá não tropeces no teu rato. – Sem me responder, continuou o seu caminho e desapareceu no meu prédio. – Que bem frequentado que anda este prédio. E tu meu menino!! Isso não se faz! Para a próxima faz pior. – Ri-me. – Sabes que mais? Vamos tirar-te isto. – Tirei-lhe a trela e deixei-o correr e brincar á vontade. Entretanto peguei no telemóvel para ver quem me tinha ligado, e liguei de volta.

-Estou? – Atendeu a Diana.

-Hello! Desculpa, eu não conseguia encontrar o telemóvel e acabei de ter um encontro com a miss arrogância.

-Hã? – Perguntou confusa.

-Longa história.

-Depois quero saber! Bom, mas eu liguei para te vestires! Vou aí buscar-te daqui a bocado para irmos à praia.

-Ok, por mim tudo bem. A que horas vens?

-Daqui a uma hora, pode ser?

-Já? Eu ainda nem tomei banho!

-Então despacha-te! Até já Bitch.

-Jerk.

Voltei para casa, e estavam todos na sala, sentados nos sofás.

-Mãe, perdoas-me se eu for sair?

-O quê? Mas acabaste de chegar!! Quando é que vais estar connosco?

-Nós vamos ter todo o tempo do mundo para conversar mãezinha. Peste, queres vir? – Dirigi-me ao meu irmão.

-Aonde?

-À praia.

-Posso? – Os meus pais acenaram que sim. – Então já lá estou.

-Vá então vai te despachar.

Passado algum tempo a Diana veio buscar-nos e conduziu até á casa da Tixa, onde nos encontrámos com eles e fomos todos na carrinha do Rui. Fomos todo o caminho divertidos a cantar músicas infantis com a Madalena, e a filmá-la a cantar e a bater palmas.

-Chegámos! – Disse o Rui ao estacionar o carro.

-BOAA! – Gritou a Madalena.

Depois de retirarmos os sacos e os chapéus do porta-bagagem, descemos umas escadas de madeira que nos levavam até á praia. Esta estava preenchida de pessoas e actividades. Tinha um bar, uma escola de surf, e bastantes sítios para lazer e diversão. Quando chegámos ao fundo das escadas, o Rui entregou a mão da Madalena à mãe e preparava-se para ir a algum lugar.

-Vão indo meninas, eu já lá vou ter. – Deu um beijo à Tixa e caminhou na direcção da escola de surf, onde mais abaixo decorria uma aula com crianças.

-Onde é que ele vai? – Perguntei.

-Não sei. – Responderam a Di e a Tixa apressadamente.

Continuei a olhar para o Rui e reparei que estava a falar com o rapaz que estava a dar a aula de surf.

-Ele conhece o professor? – Continuei.

-Sim. – Continuaram a andar pela areia, como que a evitar a conversa.

Algo estava errado ali. Sentia que elas me estavam a esconder alguma coisa. Continuei a olhar na direcção da escola de surf, e algo me fez ficar arrepiada. Apesar de estarem longe, eu não conseguia parar de olhar para o rapaz com quem ele falava. Era-me bastante familiar, e devido à distância não conseguia perceber quem era. Talvez dentro de mim já soubesse quem era, mas mesmo assim decidi confirmar.

-Meninas…O professor de surf, que está a falar com o Rui, é o…

-Sim. É o Rafa. – Respondeu rapidamente a Diana.