‘’É o Rafa’’ Estas palavras repetiam-se na minha cabeça sem que eu conseguisse controlar. O meu coração apertado batia a mil à hora e parei imediatamente de olhar naquela direcção. Comecei a andar apressadamente atrás delas e concentrei-me no meu caminho.
-Vocês podiam ter-me dito que vínhamos ter com ele!!! Para quê tanto mistério? Eu já vos disse que ele é apenas meu primo, estou completamente à vontade.
-Mas nós não viemos ter com ele. – Explicou a Tixa.
-Nós só viemos para a praia onde por acaso ele tem uma escola de surf e um bar, completamente despropositado. – Continuou a Di.
-Ah… Por acaso… Pois! Mas podiam ter me dito na mesma! E tu maninho, também sabias, não é?
-Sim, eu costumo vir com ele de vez em quando. – Respondeu o meu irmão, mais preocupado em olhar para as raparigas que passavam do que em falar comigo.
-Pois… Claro! – Respondi-lhe atirando-lhe a toalha.
-Aqui acho que está bom, ficamos aqui? – Pergunta a Tixa ao pousar o saco e o chapéu.
-Sim. Dá cá o chapéu que eu monto.
-Mamã, o meu ‘’bade’’? – Perguntou a Madalena ansiosa por brincar.
-Nãnã minha menina, primeiro o protector! Anda cá. – Respondeu a Tixa tirando o protector solar do saco. – E vocês os três também metem, o sol está perigoso.
-Sim mamã! – Respondemos eu e a Di, imitando duas crianças.
-Vão gozando! Quero ver quando for a vossa vez.
-Tshii! Eu estou bem longe disso, é que falta-me a parte principal: um namorado. –Respondeu a Di.
-Não seja por isso. – Mete-se o meu irmão à medida que lhe pisca um olho.
-Ricardo…! Tu tens 13 anos… Não tens uma fralda para mudar?
-Se for a tua. – Respondeu-lhe do mesmo modo atrevido e levou com o chinelo da Di na cabeça.
Perante esta situação eu e a Tixa já nos ríamos á gargalhada, e a Madalena também, apesar de não perceber a razão da risada.
-Isso não vai durar muito tempo. Acabaste de te formar em psicologia desportiva. Eu nem quero imaginar os atletas lindos que tu vais ter para tratar!! – Incentivou a Tixa enquanto espalhava o protector pela pele branquinha da Madalena.
-Pois, mas para isso preciso de arranjar emprego primeiro. – Lamentou-se a Di enquanto tirava o vestido ficando em biquíni.
-Pois, somos duas. – Concordei.
-Meninas, tenham calma, hão-de arranjar depressa, vão ver. Então e tu Rita, já pensaste nisso?
-Sim, vou começar já hoje à procura. Como o meu curso é mais abrangente, posso tentar em diferentes áreas que envolvam fotografia ou artes visuais.
-Eu não estava a falar disso, tonta! Estava a falar em ter filhos, já pensaste nisso?
-Ahh! Não… Ainda não. De qualquer maneira, quero orientar a minha vida primeiro, arranjar um emprego estável, uma casa... – Fiquei também em biquíni e estendi-me na toalha.
-Sim fazes bem. – Deitou-se também na sua toalha. – Filha, tens fome? – Perguntou dirigindo-se à Madalena que se encontrava em cima do meu irmão, balançando como se este fosse um cavalo.
-Não mamã. IHHAAA Anda cavalinho. – O Ricardo mantinha-se deitado de barriga para baixo, com a cabeça apoiada nos seus braços enquanto ela balançava nas suas costas.
-Maddie, sabias que os cavalos adoram comer meninas de 3 anos? – Disse-lhe o meu irmão sem se mexer.
-Não é não. Os cavalinhos comem ‘’eva’’. – Continuou a balançar-se enquanto nos ríamos da situação.
Estávamos todos deitados nas respectivas toalhas, com os olhos fechados, fazia-se silêncio, pois a Madalena estava agora deitada nas costas do meu irmão, a brincar com o seu cabelo, e sem fazer barulho. Ou pelo menos tinha estado, até alguém se aproximar.
-Vejam quem está aqui. – Disse o Rui quando chegou.
-RAFAA! – Gritou a Madalena pisando as costas do Ricardo e saltando para o colo do Rafa.
Toda a gente abriu os olhos e levantou a cabeça, menos eu, que por alguma razão, fiquei muito nervosa e mantive-me com a cabeça enterrada na toalha.
-Que pirralha tão feia! Eu conheço-te? – Ouvir a sua voz ali tão perto fez me novamente ficar arrepiada, e sem coragem para me levantar e mostrar que havia voltado.
-Sim! – A Madalena mantinha-se ao seu colo, divertida.
-Deixa ver… És a Mariana? – A pequenina acenou que não. – Ahh! Já sei! És a chatinha da minha afilhada, não é?
-Siim! – Respondeu.
-Pois, bem me parecia. O meu beijinho? – Ela deu-lhe um leve beijo na cara e ele de seguida deu-lhe um forte beijo no seu pescoço pequenino.
-‘Tão senhor professor? Abanca aí. – Disse-lhe a Di. – Há sumos nessa geleira.
-Eu vim só dizer-vos um olá, que eu ainda tenho uma au… - Parou de falar quando viu o Ricardo. – Primo?! Andas aqui a fazer?
-Vim fazer compras… Não se nota? – Responde-lhe sorridente.
- É assim mesmo, puto. – Ri-se. - Á que aproveitar os saldos. Queres vir assistir á aula? Pode ser que aprendas alguma coisa aqui com o priminho.
-Olha-me este. Eu já aprendi tudo o que tinha a aprender contigo. – Levanta-se da toalha e dirigi-se ao Rafa, mas não sem antes me dar uma forte pisadela.
-A tua aula acaba a que horas? – Perguntou-lhe a Tixa.
-Daqui a uma hora.
-Então quando acabar vem ter connosco, para irmos almoçar.
-Sim. – Dá um beijinho à Madalena ainda no seu colo, e pousa-a no chão. – Até já pessoal. – Coloca o braço por cima do Ricardo e este depressa o tira e o empurra. No meio de rasteiras e empurrões, ambos caminham para a escola de surf.
Quando me apercebi que ambos já iam longe, abri os olhos e levantei a cabeça. Tinha os olhares de todos fixados em mim, como que esperando uma explicação.
-O que é que foi? – Perguntei.
-Ainda perguntas?! – Iniciou a Tixa.
-Rita…!! Com que então, ‘’ele é apenas meu primo, estou completamente à vontade’’, não é?
-Eu sei...! Eu sei… Eu só não quis interromper a conversa. E ele também estava com pressa. O meu irmão? Aquele traidor deu-me uma enorme pisadela!
-Foi bem feita! Tu devias ter-te levantado e mostrado que estás aqui! Eu não lhe disse nada, mas vocês vão se encontrar mais cedo ou mais tarde. – Continuou o Rui sentando-se na toalha do Ricardo.
-Eu não sei o que me deu malta. Eu falo com ele quando ele voltar. Mas agora preciso de ir á casa de banho. Onde é?
-Os balneários são lá ao fundo, ao lado do bar. Queres que vá contigo? – Ofereceu-se a Tixa.
-Não, não é preciso. Até já.
Caminhei pela areia, até alcançar um soalho de madeira, que me levaria até aos balneários. Cheguei aos mesmos que se encontravam vazios e entrei na primeira porta que apareceu. Ao ver pranchas de surf, toalhas, colchões, bóias, almofadas, apercebi-me que aquela não era uma casa de banho mas sim uma sala de arrumação, provavelmente do bar que era mesmo ao lado. Quando saí é que vi que na porta havia um aviso a dizer ‘’Privado’’. Ri-me de mim mesma e virei a esquina que cruzava com os balneários. Depois de ir á casa de banho, sentei-me um pouco no banco que havia entre os chuveiros e as casas de banho, para estar sozinha. Só conseguia pensar nele…E continuava a perguntar-me: ‘’Porquê?’’. Sem ter vontade de sair dali, e para refrescar as ideias, decidi ir tomar um bom duche de água fria para ver se deixava de pensar em quem não devia. Depois de longos minutos debaixo do chuveiro, saí da cabine à medida que passava as mãos no cabelo para retirar o excesso de água. Assim que saí um braço com uma tatuagem do Bob Marley atravessou-se á minha frente, dando-me uma toalha, o que me fez apanhar um grande susto pois não estava à espera que estivesse ali alguém. Recebi a toalha sem olhar para o indivíduo a quem pertencia aquele braço moreno e tatuado. No fundo tentava ganhar coragem para ver quem eu tinha a certeza que era quem eu não queria ver. Porém, aquele perfume não deixava margem para dúvidas. Fechei os olhos, respirei fundo, e finalmente virei a cara, encarando alguém que me provocava sentimentos que eu havia lutado estes anos todos para esquecer.
-Rafael...
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